Em uma época remota, um de seus antepassados encontrara um livro. Não era um livro qualquer, ele era diferente de todos os outros. Ao passo que ele tinha indícios de ser muito antigo, sua capa e suas páginas estavam milagrosamente preservadas. Curioso é tê-lo encontrado ao relento, num campo aberto, como se alguém deixara ali especialmente para ele. Era impossível passar despercebido e não ser impactado por ele, desde o primeiro momento que o visse. Estava desacreditado pelo contexto com o que encontrara, ao mesmo tempo, intimamente envolvido... Uma capa de couro com riqueza de detalhes, ornado com ouro e esmeraldas. O dourado na lateral das páginas comunicava a harmonia, zelo e sacralidade com o que foi elaborado. Era tarde para fingir apatia... Seu ancestral não exitou em levá-lo com ele.
Desejou profundamente saber qual a mensagem do livro, no entanto, era de uma escrita ainda desconhecida. Não havia visto nada igual. Os símbolos lhe expressavam imensa complexidade, os traços pareciam tão autênticos, não derivado de nenhuma outra escrita antiga já conhecida...
Desejoso em saber o que aquele livro dizia, se empenhou incansavelmente em traduzir. Com o tempo, ele percebeu que os signos mudavam. Era um livro mágico, pensou.
Tornou-se o trabalho de sua vida e os de sua volta. Era uma escrita deveras complexa e seus anos de vida não foram suficientes, havendo pouco avanço na decodificação. Ainda com toda dificuldade, conseguiu identificar padrões e deixar como legado algum conhecimento sobre aquela língua mágica. Isto não o fez sozinho, mas muitos de sua época, inclusive linguistas, se envolveram na missão de entender a mensagem. Tornado isto um propósito quase transcendental, repassou para seus filhos e pediu que continuassem até que descobrissem qual o significado de tudo aquilo.
Isso acabou passando de geração em geração e o conhecimento sobre aquela língua mágica foi se acumulando. Passados anos e dados os avanços, houve aperfeiçoamento das estratégias de tradução e interpretação, ocasião que surge a interpretação simultânea, cuja proposta implicava na interpretação palavra por palavra e reprodução fiel dos termos, sem a menor preocupação semântica das ideias. Ironicamente, ao passo que avançavam na transliteração de palavras, perdeu-se o real propósito de saber o que o livro dizia... A mudança dos signos foi identificado por padrões. Nem se referiam mais a ela como uma língua mágica, como se esta compreensão tirasse dela o poder de causar deslumbramento. Agora, pouco importava o livro, nem sua mensagem, eles estavam obcecados pela escrita. Pelo signo e não mais pelo significado.
Gerações se passaram e chegou em você. Hoje, você pode lê-lo. O livro parece não ser mais o mesmo... Pode ser que a tal mágica do livro se desfez com o passar do tempo. É difícil dizer se é algo que ocorreu no livro ou em quem tem ele em mãos... Fato é que você começa a lê-lo. O título: "O Mito" e a história que ele conta, com riqueza de detalhes, é da sua vida e dos seus ancestrais.
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